Grandes expedições, descobertas e conquistas de territórios sempre exerceram um enorme fascínio sobre os homens. Alguns levam esse desafio ao limite, fazendo da sua vida e do seu trabalho uma repetida busca pela experiência do quase impossível, por tocar a natureza selvagem, às vezes violenta, virgem, que ninguém ainda pisou.
As fotos deste livro contam uma dessas histórias de loucura e coragem, escrita pela persistência de alguns desses homens que chegaram bem próximos do Polo Norte do nosso planeta com o objetivo de tentar algo que nunca ninguém tinha tentado antes sem ao menos terem certeza de que tal feito seria realmente possível. Quatro aventureiros que tem em comum a paixão pela natureza, pelos esportes radicais e pela fotografia extrema.
O objetivo da missão parece tão espetacular quanto inacreditável: saltar com um caiaque de uma cachoeira de aproximadamente 20 metros de altura, formada somente durante o verão nas geleiras do ártico, quando parte da superfície dela sofre o degelo devido às temperaturas mais elevadas nessa época do ano.
A aventura acontece no ano de 2012 e tem início em Svalbard, um conjunto de ilhas ao Norte da Noruega, com uma população de aproximadamente 2,7 mil pessoas, na sua maioria formada por uma comunidade de cientistas e estudantes. De lá, um veleiro de 45 pés viajou com a equipe por 13 dias até cruzar o paralelo 80, localizado apenas 900 quilômetros abaixo do Polo Norte da Terra.
Para registrar a viagem, a produção do Canal Off convidou o fotógrafo Alexandre Socci, que acompanhou de perto todo o percurso e pôde registrar de forma única os detalhes de cada uma das etapas desta missão, desde a preparação, ainda em solo norueguês, a viagem pelo mar agitado, as tempestades de gelo, o perigo dos icebergs e ursos polares, chegando onde, muito provavelmente, poucos seres humanos chegaram no período recente da história, para tentar algo nunca imaginado antes no mundo dos esportes.
Nossa missão: gravar a quarta temporada do programa Kayak, produzido pela Célula e exibido pelo Canal OFF. A expedição durou dois meses no total, sendo quase trinta dias na Noruega, saltando cachoeiras no país que é considerado a “Disneylândia" do esporte. Porém, o que mais motivava nossa equipe era chegar no conjunto de ilhas habitado mais ao norte do planeta: Svalbard.
Foram aproximadamente 25 dias na Noruega, acampados e economizando cada centavo para viabilizar a expedição aos glaciais. Nosso orçamento original não contava com essa ida ao extremo norte do planeta. Viajar já não é barato; quando se fala em chegar a lugares inóspitos as cifras geralmente triplicam. Só o aluguel do barco com o mínimo necessário para nos levar até as geleiras, custaria 45 mil dólares por dez dias. O risco era grande; a chance de todo esse esforço extra ir por água a baixo era mais alta do que gostaríamos, mas precisávamos tentar, afinal, a incerteza faz parte de toda expedição.
Este relato, dividido em 10 capítulos, mostrará semanalmente todos os detalhes da missão: o frio de 25 graus negativos, o sol que nunca se põe nessa época do ano, o inesperado encontro entre os ursos brancos e nossa tripulação, as tempestades, o medo, o isolamento e o prazer de concluir todo o roteiro e trazer de volta um documentário único e fotos incríveis.
Svalbard, no território ártico norueguês, é considerado o ponto da Terra permanentemente habitado mais próximo do Polo Norte e fica a menos de 900 quilômetros de distância do centro do marco geográfico. É banhado pelo Oceano Glacial Ártico ao Norte, pelo mar de Barents a Leste, pelo mar da Groenlândia a Oeste e pelo mar da Noruega, ao sul.
O arquipélago foi habitado durante muito tempo por povos das regiões árticas europeias e asiáticas, aparecendo em referências históricas medievais dos povos da Lapônia e dos vikings, que o consideravam um território sagrado. Até o final do século XVI, mesmo sendo conhecidas, as ilhas foram ignoradas durante muito tempo por potenciais colonizadores, provavelmente por constituir um território inóspito e remoto.
Com o significado de “costa fria”, Svalbard está sob soberania norueguesa, mas conta com uma política específica de acesso aos recursos naturais pela comunidade internacional, regida pelo Tratado de Svalbard, assinado em 9 de fevereiro de 1920, em Paris. A soberania do arquipélago ficou indefinida por quase trezentos anos, pois vários países estavam interessados em iniciar a exploração industrial no local. O tratado foi assinado originalmente entre Noruega, Estados Unidos, Reino Unido, França,Canadá, Austrália, Dinamarca, Itália, Países Baixos, Suécia e Japão. Depois,União Soviética e Alemanha aderiram. Hoje, o acordo reúne mais de quarenta signatários e permite que a Noruega regule a exploração e tome as medidas necessárias de proteção ambiental, mas impede qualquer privilégio a cidadãos ou empresas norueguesas.
Apesar de ser uma zona desmilitarizada, Svalbard foi quase totalmente destruída em setembro de 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, bombardeada pelos alemães. Mesmo reconstruída, alguns restos da antiga cidade de Longyearbyen, sua capital, ainda são visíveis.
O clima extremamente frio e o território inóspito fazem de Svalbard um lugar único e difícil de se viver. A região passou a contar com uma população fixa somente depois da descoberta de jazidas de carvão e da exploração comercial das mesmas. Estima-se uma população de 2,7 mil pessoas, sendo 1,8 mil noruegueses.
Nosso destino em Svalbard é a cidade de Longyearbyen, a capital administrativa e econômica do arquipélago. Fundada em 1906 pelo investidor norte-americano John Munro Longyear, a comunidade leva esse nome em homenagem a ele, o principal acionista da Artic Coal Company, de Boston, empresa criada para a exploração de carvão na região. O sufixo byen é a partícula da língua norueguesa que significa cidade.
Com um aeroporto minúsculo, é a localidade mais setentrional do planeta, situada na tundra ártica e em uma faixa climática de baixíssimas temperaturas; no inverno elas atingem 50 graus negativos. Longyearbyen, assim como o restante de Svalbard, é um lugar inóspito, que não vê a luz do sol durante três meses do ano, ou seja, vive uma estação à noite, quando a população de 2.7 mil habitantes cai para cerca de 200 pessoas.
Apesar de minúscula, a cidade tem, desde 1993, uma universidade de estrutura ultramoderna, com cursos de graduação e pós-graduação voltados para a vida no Ártico, como geologia, agricultura e turismo, além de pesquisas geofísicas ligadas à aurora boreal.
Longyearbyen seria o ponto de partida para fotografar e filmar a tentativa de um salto inédito com um caiaque do alto de uma cachoeira de glacial. Fizemos uma programação meticulosa do cronograma de viagem, transporte, mantimentos, equipamentos dos atletas, dispositivos de segurança e, é claro, de toda a parafernália que levaríamos para registar tudo isso. Estávamos prontos para partir numa expedição a um dos territórios mais inóspitos da Terra.
Continua...